A medicina de família, no Brasil, é frequentemente desvalorizada entre as outras especialidades. Isso ocorre, primeiro, pela falta de posicionamento de muitos profissionais como médicos sérios e, segundo, pela tendência de levar a especialidade para o âmbito político. Como residente de medicina de família, reconheço que não se pode generalizar, pois existem muitos médicos competentes que realizam um trabalho de qualidade no tratamento de doenças. No entanto, muitos desses profissionais não se dedicam à reflexão sobre a eficácia do sistema em que atuam, apoiando, às vezes, iniciativas que podem piorar ainda mais a saúde no país e fragilizar a especialidade.

É importante refletir: qual é a função de um médico de família? Na prática, o médico de família não possui nenhuma habilidade ou recurso exclusivo que o diferencie significativamente de outras especialidades, algo que apenas ele saiba e outros médicos não possam aprender. Contudo, acredito que podemos incorporar habilidades específicas que seriam benéficas tanto para a população quanto para os médicos e o próprio sistema de saúde.

Um exemplo disso é a ultrassonografia, que, de acordo com a Resolução CFM nº 2.330/2023, publicada em 15 de março de 2023, já é reconhecida como uma subespecialidade da medicina de família. Qualquer médico que já tenha estudado ultrassonografia sabe que ela é uma área que exige esforço e habilidade, sendo, por si só, uma especialidade completa. Além disso, a ultrassonografia é um exame que remunera por produção, o que a torna ainda mais relevante para o sistema.

Acredito que na residência de medicina de família e comunidade deveria haver um investimento maior na inclusão da prática de ultrassonografia nas unidades básicas de saúde. Durante a residência, os médicos poderiam aprender a realizar exames básicos, como ultrassonografia abdominal e obstétrica. Imagine os benefícios disso em diversos aspectos:

  • Para o paciente: Ter a comodidade de realizar o exame com o próprio médico, fortalecendo o vínculo e evitando deslocamentos desnecessários.
  • Para o sistema de saúde: A prefeitura já precisa custear os exames em algum nível. Incorporar ultrassonografia na atenção primária traria maior resolutividade, reduzindo encaminhamentos e o tempo de espera para exames.
  • Para o médico: Além do salário base, o profissional poderia dedicar um dia na semana para realizar ultrassonografias, recebendo por produção. Por exemplo, ao realizar 15 exames em um dia, o ganho adicional seria expressivo, correspondendo ao valor de 15 vezes o custo de cada exame, equivalente a um plantão adicional. É importante ressaltar que a ultrassonografia exige precisão e atenção, já que um exame mal realizado pode comprometer a segurança do paciente e a credibilidade do profissional.

Essa prática aumentaria a resolutividade na atenção primária, melhoraria o vínculo com os pacientes e geraria economia para o estado. Além disso, qualificaria os médicos de família, conferindo-lhes uma habilidade a mais em relação aos médicos gerais e abrindo portas para uma futura especialização em ultrassonografia. Com esse treinamento inicial, seria possível, no futuro, avançar para procedimentos mais complexos, como biópsias guiadas e bloqueios, ampliando ainda mais a resolutividade do atendimento.

Conclusão: todos ganhariam com a inclusão da ultrassonografia na formação e prática da medicina de família — o paciente, a prefeitura e o próprio médico, que se tornaria mais capacitado e valorizado.

OBS: Outra área que poderia ser integrada à medicina de família é o treinamento para realização de partos. Durante a residência, seria interessante incluir capacitações específicas em partos normais e cesáreas. Essa formação ampliaria o vínculo entre médico e paciente, pois as gestantes sentiriam ainda mais segurança ao serem acompanhadas pelo profissional que também realizaria o parto.

Nos Estados Unidos, essa prática já é comum, onde muitos pacientes têm seus filhos com seus próprios médicos de família, que também são seus médicos de confiança para outras questões de saúde. No entanto, este é um tema que pode ser explorado em outro momento. Caso haja interesse, tenho tudo organizado sobre como dividir o treinamento e aplicá-lo na prática. Estou aberto a discussões futuras com aqueles que se interessarem por este tópico.

Texto escrito por Igor Takakazu Ribas Asato, residente em Medicina de Família e Comunidade.


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